É poucochinho que as alternativas se apresentem entre o bota-abaixo ou amnésia em relação aos últimos anos

Vivemos um tempo especial, amarfanhado, combalido, limitado pelas regras para combater a covid-19 e com demasiadas incertezas no horizonte das pessoas, das instituições e das nações. É um tempo sem grande espaços para as emoções, as paixões e os convívios nos termos em que os vivíamos no pré-pandemia, em que a racionalidade, a precaução e o sentido da estabilidade deve estar presente, mas não.

Recrudesce no Benfica, depois de uma época mal conseguida, que ainda assim coloca o SLB com 5 títulos conquistados nos últimos 7 anos, a amnésica tentação do bife do lombo. É como se a vaca tivesse sido criada, abatida e em vias de ir para o prato em modo de bife do lombo para potencial deleite de quem se alheou do processo produtivo ou nunca sustentou internamente o chorrilho de críticas que agora enuncia para procurar esboçar caminhos diferentes. Entre o nada e o tudo mal, há a realidade, o caminho que foi construído e um patamar de sustentabilidade que o Benfica nunca teve na era moderna e que se deve a Luís Filipe Vieira e aos que com ele mantiveram o compromisso de trabalho de não colocar os egos à frente da instituição.

A vida das instituições como a de muitos de nós, é feita mais de ossos do que de bifes do lombo, mas há uns predestinados que acham que podem deixar que os outros façam todo o trabalho de resgate do degredo em que estava o clube pós-Vale e Azevedo, o percurso de valorização dos ativos patrimoniais do clube, do Seixal ao Museu Cosme Damião e o reforço do posicionamento desportivo, social e financeiro, para depois proclamarem o fim de um ciclo, como se não houvesse memória e o passado pudesse ser descartado para a construção do futuro.

O que está em causa nas próximas eleições do Sport Lisboa e Benfica é saber se os sócios querem colocar em causa o bife do lombo que foi construído, certamente com muitos acertos e alguns erros, que em nada beliscam a solidez da realidade alcançada. O Benfica está mais sólido, sustentável e com condições para enfrentar os desafios e as incertezas do que nunca. Não se ouve uma palavrinha para o Seixal, o Museu Cosme Damião, o Estádio ou a BTV no acervo patrimonial do clube, nem um esboço de agrado para o reforço das modalidades, a Fundação Benfica ou o desporto no feminino. O que importa é invocar os adversários, as situações em processo de aclaração judicial e o que correu menos bem para proclamar a dealbar de um novo ciclo. Novo, nas críticas bota-abaixo a quem constrói o Benfica, amplificadas por media sedentos de novelas para vender jornais e ter audiências? Novo, nas piadas, nos comentários televisivos e nas crónicas que, à conta do clube, se constituem em arma de arremesso dos adversários do Benfica? Novo, na gestão, na inovação ou no escrutínio, quando o clube conquista prémios, tem provas de confiança dos mercados e esteve sujeito à maior devassa de conteúdos privados de que há memória, entretanto truncados e utilizados por concorrentes diretos, enquanto se assiste ao branqueamento do cibercrime.

Novo ciclo, só se for com o pior dos tiques do velho ciclo de Vale e Azevedo. É que o atual ciclo de Luís Filipe Vieira não contou com algumas das elites emergentes alérgicas a pôr a mão na massa para o trabalho de reposicionamento sólido do Benfica, que olham de soslaio para as origens e a personalidade de Luís Filipe Vieira. Contou com efetivas distorções das instituições do futebol português e do sistema judicial que sob a capa do mediatismo de investigações perpetuaram um funcionamento dual, em que os de sempre a norte beneficiam, não são investigados e tudo podem com efetiva causa-efeito, para colocar os holofotes a sul. E as elites incomodam-se, mas não combatem. Gerem silêncios, enquanto gravitam à volta do clube e do trabalho em curso.

Portugal, a Europa e o mundo estão a atravessar uma pandemia singular, com enormes consequências e muitas incertezas.

O caminho percorrido e os resultados alcançados permitem ao Benfica ter capacidade de reação e de construção de soluções. Tivessem os caminhos sido outros e não estaríamos tão habilitados para superar esta fase, corrigir os erros e voltar à senda vitoriosa dos últimos anos. Sim, habitámo-nos a ganhar, mas o perder está na equação de qualquer competição aberta. Sim, estamos mais fortes, menos dependentes da banca e dos credores, porque foram feitos negócios, houve confiança dos investidores e os sócios mantêm um compromisso com o clube, em Portugal e no mundo. É aliás inacreditável que, á falta de melhor, uma das linhas dos ataques a Vieira seja o dos negócios com a venda de jogadores, das operações financeiras desenvolvidas e de outros atos de gestão, como se na advocacia, na fast-food ou na gestão de uma rádio não existisse uma dimensão negocial em que os objetivos nem sempre são alcançados. Segundo as luminárias haveria um Benfica dos Negócios e um Benfica da Paixão, do amor à camisola, da mística e da alma benfiquista, como se não tivessem existido ao longo dos últimos anos as duas dimensões e se a realidade nacional permitisse uma sem a outra, com obtenção de resultados desportivos.

Mais do que a tentação, parece haver alguns com ânsias de bife do lombo. Aparentam não olhar a meios, ter os media a enfunar as velas e querer proclamar alternativas assentes em fazer o contrário do que foi feito ou afirmar uma alegada superioridade moral elitista. Duas derivas que conduziriam à delapidação do que foi conquistado sob liderança de luís Filipe Vieira e de um triste regresso à época das vitórias morais perante o gáudio dos adversários, dos que sobrevivem das novelas no Benfica e dos que se conformam com a força, a alma e a amplitude do Sport Lisboa e Benfica.

Num clube com tanta história, é poucochinho que as alternativas se apresentem entre o bota-abaixo ou amnésia em relação aos últimos anos, focando quase tudo na realidade deste ano. Nos últimos 7 anos são 5 títulos de campeão nacional, o FC Porto teve 2. A tentação do bife do lombo tem saudades de outros passados. Nós, não.

NOTAS FINAIS

VAZIA. O quadro pandémico traz-nos a Fórmula 1 de regresso a Portugal. É bom para o ego e com alguns retornos interessantes. Foi sensato não repetir a encenação do anúncio da fase final da Liga dos Campeões.

COSTELETA. Mais uma semana, sem sabermos os nomes dos jornalistas avençados do BES/GES/Ricardo Salgado. São o terceiro segredo do BES, persistente…

OSSO. É ridículo que PS e PSD persistam alimentar o anti-parlamentarismo. O fim dos debates quinzenais e o aumento de assinaturas exigidas para as petições são duas boleias dadas ao populismo.